Conheci Dan Ariely há cinco anos, quando ele veio para São Paulo participar de um evento da indústria de fundos de investimentos. Desde então, sempre penso no que ele falou. Diante de centenas de executivos brasileiros e estrangeiros, naquela época ainda inebriados pelo vigor da economia brasileira e tranquilos com o rumo do país, Dan se destacou. Foi intrigante. Incômodo, para não dizer perturbador.
Essa era a intenção dele. Psicólogo com pós-graduação em negócios, Dan é especialista em economia comportamental. Passa grande parte de sua vida fazendo experiências com as pessoas para identificar comportamentos irracionais em tudo que está relacionado com o dinheiro. Ele observa desde a resposta das pessoas com relação às estratégias de marketing até decisões ligadas a poupança e investimentos.
Como exemplo de nossos comportamentos irracionais, Dan costuma contar a história dos ovos nos pacotes de brownies. Os fabricantes de brownies, desses pré-prontos, perceberam que o produto não tinha boas vendas. Então decidiram retirar os ovos da receita e explicar ao consumidor como “preparar”. A mudança foi simples, mas fundamental. As pessoas ficavam felizes de fazer algum esforço – consideravam-se mais “cozinheiras” por quebrar dois ovos e misturar com o pó. Foi um sucesso de vendas.
Uma das experiências do psicólogo mostra diferentes percepções em relação a um mesmo valor de dinheiro. Trazendo ao universo brasileiro, vamos supor que você queira comprar uma máquina fotográfica. O preço é R$ 500 e, na hora de pagar, o vendedor te conta que a três quarteirões dali uma outra loja vende a R$ 400. O que você faz? Bem, muitas pessoas deixam a máquina e vão até a outra loja.
Agora, vamos supor que você esteja comprando um bem mais caro, como uma filmadora especial que custe R$ 15 mil. Antes de fazer o pagamento, o vendedor te diz que a três quarteirões dali uma loja concorrente tem o mesmo equipamento por R$ 14.900. O que você faz neste caso? A maioria das pessoas tende a comprar ali mesmo. Oras, são os mesmos três quarteirões, o mesmo tempo de deslocamento e os mesmos R$ 100.
O que muda é a referência, certo? R$ 100 parece pouco se comparado a R$ 15 mil, afinal, é só 0,6% do total. Mas é 20% de R$ 500. Para a construção de sua riqueza, são R$ 100.
Entre tantas outras armadilhas que nossa cabeça nos prega, há também a resistência em enxergar o ato de poupar para o futuro como uma necessidade, um compromisso.
Todos sabemos que precisamos de dinheiro hoje e que precisaremos de dinheiro no futuro. Também sabemos que um dia vamos querer coisas que custam mais do que nosso salário mensal, como um carro ou um apartamento, ou então querer fazer um curso. Sabemos também que, no futuro, vamos nos aposentar.
Dito dessa forma, parece óbvio afirmar que precisamos guardar dinheiro e investir. Mas, na prática, costumamos ignorar esse assunto, como se fosse de última importância nas nossas vidas.
Dan Ariely diz que no Chile o governo transfere automaticamente 11% do salário dos trabalhadores para um investimento destinado à aposentadoria. As pessoas podem escolher se querem investir em ações ou títulos do governo. Isso elimina o maior desafio do poupador: a disciplina para poupar.
Assim como Dan Ariely, Renato Breia, consultor financeiro do Criando Riqueza, defende que as pessoas têm que ver a poupança como um compromisso, da mesma forma que veem o pagamento das contas.
Como se incluíssemos, na nossa cabeça, uma “caixinha para o dinheiro do investimento”, da mesma forma que há uma “caixinha para as contas de casa”, uma “caixinha para as contas do transporte” e uma “caixinha da conta do celular”, por exemplo.
Com base no que observa no contato com seus clientes, o Renato diz que, para dar certo, esse processo tem que ser “um pouco automático”. “Mais importante do que pensar onde investir, e qual produto de investimento, é pensar no ato de poupar como um débito automático. Colocar o investimento como um gasto. ”
Portanto, antes de se perder diante de dezenas de possibilidades para investir sem nem mesmo ter o hábito de poupar, assuma o compromisso de separar, todos os meses, algum dinheiro para o futuro. No começo, pode ser pouco. Mas tenha em mente que qualquer valor é válido para criar uma disciplina com o objetivo da construção de seu patrimônio.
Se conseguir adotar essa prática, você já terá vencido um grande desafio. Saber onde investir, eu garanto, será mais fácil.
Uma grande vantagem de ter essa disciplina para poupar é deixar de ser refém dos bancos. Com disciplina para guardar dinheiro todos os meses, você terá mais liberdade para escolher produtos de investimentos melhores. Sabendo da dificuldade das pessoas em ter um comportamento mais firme em relação ao dinheiro, os bancos aproveitam para oferecer produtos com os quais são mais beneficiados, de formas fáceis de comprar.
Com um simples clique no caixa automático – ou mesmo com um “sim” tímido para o gerente – você pode cair em armadilhas como os títulos de capitalização, por exemplo, que estão longe de ser um investimento e muito longe de ser um bom destino para o dinheiro de qualquer pessoa.
Primeiro investimento
A sugestão do nosso consultor financeiro é começar pelo Tesouro Direto. Com R$ 30 já é possível começar a aplicar. “Mas mesmo para quem tem mais dinheiro, o Tesouro é uma ótima opção”, diz. Essa opção nada mais é do que a compra de títulos da dívida do governo brasileiro. Ou seja, você “empresta dinheiro” ao governo e ele te devolve depois de um tempo com um adicional de pagamento de juros, que é o seu retorno do investimento, que você pode ouvir ou ler por aí como ROI.
O Renato ressalta que investidores que possuem até R$ 50 mil para investir têm o Tesouro Direto como um ótimo destino para seu dinheiro considerando segurança e rentabilidade. Quando juntar valores mais altos, você pode diversificar para outras opções. A percepção do nosso consultor, com base em sua experiência, é a de que hoje os produtos de bancos de quem têm até R$ 50 mil não são bem remunerados. “Em geral, os clientes são muito mal tratados pelos bancos tanto em termos de variedade de produtos como em termos de remuneração”, ele diz.
Em geral, bancos e corretoras oferecem produtos com rentabilidades mais altas e taxas de administração mais baixas apenas para clientes que já estão superando os R$ 100 mil em investimentos. Se você ainda está longe desse patamar, certamente não tem um atendimento especial do banco. Então, se o banco não te agrada, também não há razão para agradá-lo comprando produtos que são interessantes apenas para o outro lado.
Voltando ao Tesouro Direto…
Além de ser uma opção mais segura, essas são algumas das outras vantagens:
- O site do Tesouro Direto é bastante claro. Explica como investir de forma bem fácil: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/tesouro-direto
- Retomando o tema inicial desse artigo, o Tesouro Direto permite programar o investimento, o que ajuda na disciplina para investir. Em contato com o banco ou com a corretora, você pode programar uma espécie de “débito automático”, ou “aplicação automática”.
- A partir deste ano, o Tesouro passou a ter liquidez diária, o que significa que você pode vender seus títulos todos os dias.
- O retorno é bom. Como o Brasil tem uma alta taxa básica de juros (Selic) e também uma alta inflação, os títulos do Tesouro que acompanham Selic e inflação pagam bem.
- É bem fácil de aplicar. Você precisa apenas ter uma conta em um banco ou em uma corretora para começar.
Algumas cobram taxas de administração, outras não. O site do Tesouro Direto (Clique e conheça) tem a lista completa, mas peguei os 12 primeiros, que tem taxas de administração de até 0,10%.
Depois de aberta sua conta em uma instituição financeira, você pode escolher em quais títulos vai investir. É bom saber de antemão que embora o Tesouro Direto seja um investimento de renda fixa, seus preços e taxas variam com o tempo. Por definição, a renda fixa é um tipo de investimento que você já sabe as condições de remuneração do seu dinheiro. Mas isso não quer dizer que sempre saiba qual vai ser a sua rentabilidade final.
Por exemplo, um dos títulos do Tesouro Direto acompanha a inflação. Outro tipo é atrelado à Selic, que é a taxa básica de juros brasileira. Nesse último caso, hoje é possível saber que a aplicação vai ser indexada ao valor da Selic (que enquanto escrevo esse texto está em 13,25% ao ano). Mas, caso a taxa suba ou caia, a rentabilidade também vai subir ou cair.
É possível também reinvestir automaticamente os rendimentos de sua aplicação, tanto o dinheiro que você recebeu de pagamento de juros como o dinheiro do título, na hora do vencimento e do resgate. Nessa semana mesmo recebi um e-mail do Tesouro Direto, onde tenho uma parte de meus investimentos, falando sobre essa possibilidade. No e-mail, a equipe do Tesouro explicava que o agendamento poderia ser feito no site da própria instituição financeira que eu escolhi.
Enquanto você está lendo todo esse detalhamento sobre o Tesouro Direto, imagino que tenha questionado, na sua cabeça, a razão de darmos essa ênfase no Tesouro Direto, já que existem tantos outros tipos de aplicações, certo?
Bem, na realidade, a reposta é bem simples: na comparação com outros tipos de aplicações, o Tesouro Direto é mais vantajoso do que outras opções disponíveis a quem ainda não tem suas centenas de milhares de reais para investir.
É muito melhor do que outros tipos de produtos financeiros que são constantemente sugeridos pelo banco, como é o caso do chamado “CBD” e também dos fundos DI. O Renato Breia fez, recentemente, um outro relatório que detalha um pouco mais a comparação entre as duas aplicações.
No dia 5 de maio, quando fiz a pesquisa para escrever esse texto, estes eram os títulos disponíveis para a compra no Tesouro Direto:
Veja que estavam disponíveis títulos indexados à inflação (IPCA) com vencimentos diversos, títulos prefixados e também um Tesouro Selic com vencimento em 2021.
A rentabilidade que aparece na terceira coluna, no caso dos títulos prefixados, é exatamente a taxa que você vai colher no vencimento do título.
Nos outros casos, do Tesouro IPCA+ (que antes se chamava NTN-B) ou do Tesouro Selic (que antes se chamava LFT), o número de retorno indicado será somado à variação do indexador: a inflação medida pelo IPCA e a taxa básica de juros, respectivamente.
Esse percentual corresponde à rentabilidade bruta, antes dos impostos (que variam de 22,5% até 15%) que você terá caso compre o título no mesmo dia e apenas se desfaça dele no dia do vencimento.
Não se assuste com os preços de compra, que superam os R$ 500. É possível comprar apenas uma fração dos títulos.
Minha sugestão, para já, é que você adote o hábito de guardar um pouco de dinheiro, todos os meses, para investir no seu futuro. Lembre-se das histórias do Dan Ariely – dos brownies, dos equipamentos e também da poupança – e tente ser um pouco mais racional, no dia a dia, em suas decisões envolvendo dinheiro.
E, se possível, hoje mesmo navegue no site do Tesouro Direto. Veja os vídeos explicativos, que são curtos. O site é bem completo e tem boas explicações, o que pode te ajudar a se sentir mais confortável com esta modalidade.
Se você chegou até aqui e quer saber mais detalhes sobre, quais títulos deve escolher, como encontrar a melhor instituição para investir no Tesouro Direto entre outras questões, sugiro conhecer nossa plataforma “Criando Riqueza” (Clique aqui para conhecer).
Até a próxima!
Nota: Esta coluna é mantida pela Empiricus, que contribui para que os leitores do Dinheirama possam ter acesso a conteúdo gratuito de qualidade.
Foto: A businessman showing brazilian money, Shutterstock.