Nesta segunda e última parte, vou me concentrar em um aspecto que surgiu durante o debate do “Painel 1 – Diagnóstico de Mercado”, onde especialistas afirmaram que a taxa de juros hoje exerce o mesmo papel da inflação no passado. Vale lembrar que as discussões do Fórum se concentraram basicamente nas classes C, D e E.
Como devemos encarar o endividamento?
Se o arrocho e as perdas salariais reais, somados à alta constante de preços corroia impiedosamente a renda das então chamadas classes média e baixa, hoje as classes menos favorecidas, principalmente as C e D, veem parte de sua renda comprometida com o pagamento de juros em função de dívidas não honradas.
Alguns economistas veem os índices de inadimplência observados nessa população como um fenômeno natural e passageiro. A justificativa para esse tipo de visão é que como o crédito nunca esteve tão acessível, as pessoas não estão preparadas para esse primeiro contato. Estes acreditam que, com o passar do tempo, elas aprenderão a lidar melhor com essa questão.
Ora, isso equivale mais ou menos ao seguinte: suponhamos que ao completar 18 anos, todos os brasileiros recebessem sua Carteira Nacional de Habilitação, sem que para isso tivessem que se preparar. O único pré-requisito para o acesso à CNH seria a maioridade. E que, em função disso, os acidentes provocados pela imperícia e falta de experiência dos recém-habilitados fossem vistos como parte integrante do processo de aprendizado e, portanto, considerados um fenômeno natural e passageiro.
Eu, particularmente, não tenho essa visão tão simplista e otimista do assunto. Não acho que essa população aprenderá sozinha com seus erros em relação ao não pagamento das contas e aos altos juros. Além disso, as conseqüências do endividamento excessivo, tanto do ponto de vista micro quanto macroeconômico, são desastrosas.
Lidar com dinheiro é questão de cidadania
A própria Parceria Nacional para Inclusão Financeira (PNIF), assim como a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), parte do princípio que desequilíbrios financeiros individuais, quando em massa, podem desequilibrar o sistema econômico do país como um todo.
Uma série de iniciativas voltadas para o uso consciente do crédito vêm sendo implementadas em vários segmentos, mas informação não basta para modificar comportamento. Além disso, é preciso criar condições para que as pessoas tomem decisões mais acertadas.
A Arquitetura de Escolhas da Economia Comportamental pode ser uma ferramenta valiosa, tanto em termos de políticas públicas, quanto em termos de aplicação na iniciativa privada para o público adulto.
Quanto aos jovens que ainda não cristalizaram comportamentos e crenças referentes ao consumo, poupança, crédito e investimento, considero a Educação Financeira, dentro da perspectiva da Alfabetização Econômica, uma poderosa aliada. Bem, de qualquer forma passos importantes vêm sendo dados nessa área. Mas todos nós temos nossa parcela de responsabilidade:
- O governo através das políticas públicas;
- A esfera privada através de parcerias e iniciativas dentro do seu campo de ação;
- Nós, cidadãos, entendendo que Finanças e Economia não são áreas envoltas numa espécie de névoa onde só os especialistas conseguem caminhar sem se perder, mas sim duas áreas onde nós, pessoas comuns, somos inseridas desde muito cedo (e hoje cada vez mais cedo) e por onde transitaremos até o final de nossas vidas.
Por fim, é igualmente importante entender que a situação do país reflete a somatória dos comportamentos e ações individuais. Cidadania, afinal, é participar, agir e transformar.
Foto de sxc.hu.